A Federação Brasileira dos Geólogos – FEBRAGEO fazendo uso desta oportunidade para vir a público manifestar nossa preocupação e postura crítica em relação ao Projeto de Lei nº 529/2020, de iniciativa do Senhor Governador do Estado de São Paulo [João Dória], que tramita em regime de urgência na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp). O Projeto de Lei, publicado no Diário Oficial em 13/08/2020, propõe uma série de medidas consideradas necessárias ao equilíbrio das contas públicas, alegando aumento significativo das despesas e diminuição das receitas tributárias em razão da pandemia de COVID-19.
Não é difícil compreender a singularidade do momento e a necessidade de medidas de austeridade fiscal. Entretanto, ponderamos que os efeitos de tais medidas devem ser avaliados com prudência e racionalidade, de forma a não causarem impactos adversos irreversíveis no médio e no longo prazo, desestruturando as relações entre o setor público, a cadeia produtiva e a sociedade como um todo. Dentre os impactos adversos estão a supressão definitiva de determinadas áreas do conhecimento e de setores ligados à pesquisa científica e à inovação tecnológica, a interrupção de serviços técnicos especializados que demandam mão de obra altamente qualificada. Essas são atividades essenciais para o enfrentamento dos desafios atuais e futuros, e em particular para o desenvolvimento socioeconômico do Estado e do País.
Uma das medidas propostas, no Artigo 66 do PL nº 529/20, é a de promover a fusão (unificação) dos Institutos de Pesquisa da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA), a saber, Instituto Geológico, Instituto de Botânica e Instituto Florestal (este último a ser extinto), sem considerar as características, atribuições, áreas do conhecimento e de atuação dessas instituições. Salvo melhor juízo, não vimos na proposta encaminhada à Alesp, qualquer argumentação, estudo ou avaliação prévia que demonstrasse a economicidade da medida, bem como a viabilidade operacional e financeira de sua implementação, de forma a garantir a continuidade das atividades e dos serviços prestados por estes institutos. No caso do Instituto Geológico, a medida representa o desaparecimento de uma área estratégica de conhecimento, como a de Geociências, que inevitavelmente perderá sua função e aplicabilidade. Lembrando que o Instituto Geológico desenvolve pesquisas, presta serviços de consultoria e assessoria técnica, emite laudos e pareceres para diversas entidades e poderes públicos (incluindo Órgãos de Licenciamento, Poder Judiciário, Prefeituras Municipais, Ministério Público), e atende políticas setoriais estratégicas, incluindo: defesa civil, prevenção de riscos e gestão de desastres naturais, recursos hídricos, transportes, habitação, planejamento, energia e mineração.
Chamamos a atenção ainda para o disposto no Artigo 17, do PL nº 529/20, que prevê que o superávit financeiro dos Fundos Especiais de Despesas (receitas próprias geradas pelas instituições de pesquisa e outras) será transferido ao final de cada exercício à Conta única do Tesouro Estadual (TESP). Assim como indicado em medida similar aplicada às Universidades e à Fapesp, a aprovação de tal medida irá causar prejuízos irreparáveis à todas as atividades científicas do Estado de São Paulo, e no caso do Instituto Geológico e demais institutos de pesquisa da administração direta, inviabilizará o funcionamento das instituições num futuro próximo. Há que se ressaltar, que os recursos arrecadados pelos Fundos Especiais de Despesa (FEDs), contribuem significativamente para o custeio das atividades-fim das instituições, além de atender, de forma complementar, a diversas despesas de custeio para as quais os recursos do TESP são insuficientes. Considerando que as medidas previstas pelo projeto de lei visam o reequilíbrio dos cofres públicos, especialmente em relação à questão do déficit previsto para o exercício de 2021, não faz sentido que os recursos financeiros dos FEDs sejam comprometidos por período indeterminado (conforme proposto no PL nº 529/20). Tal medida, se aprovada, pode comprometer seriamente o desempenho das instituições envolvidas, além de gerar novas pressões orçamentárias ao Tesouro do Estado (hoje aliviadas pelas receitas próprias que constituem os FEDs, como no caso do Instituto Geológico), o que tornaria a medida ineficaz, em termos de economia.
Por esta razão, solicitamos a colaboração dos senhores deputados e de toda a sociedade paulista no sentido de assegurar que tais medidas não venham a se tornar um grave empecilho à pesquisa científica e tecnológica, ao esforço de adaptação às mudanças climáticas, ao enfrentamento dos desastres naturais e ao desenvolvimento socioeconômico sustentável do Estado de São Paulo.